Saturday, September 15, 2007

Um dia diferente

Pouco antes de adormecer, naquele instante em que as mãos percorriam o teu rosto, lendo em Braille os sentimentos de ambos. Ali surgiram recordações de nós dois. Um Flashback de tudo o que passamos, recordo, o primeiro olhar, cego, em que ambos olhamos sem certezas do que observávamos. Um ignorar de algo que nunca poderia ser ignorado. Agora aqui estou ao teu lado, sem darmos conta percorremos o tudo que antes era nada. Abraço-te no calor de uma noite fria, sem nada temer. Agora sinto as certezas daquela brisa nocturna que carrega até mim essas recordações : esquecidas; perdida, no passado que agora recordo. Percorro esse teu sorriso e subitamente arrependo-me profundamente de certos actos, arrependo-me apesar de estarmos juntos. Aquele sentimento invade, cada pedaço da minha pele. Quero continuar ao teu lado, para além deste presente, daquele passado quero construir um único e nosso futuro. Nada será escuro, a idade das trevas já lá vai e eu irei iluminar cada manhã como aquelas de verão que tanto desejamos. Acordarei sempre ao teu lado, sem desejar outro final alternativo. Aos poucos e poucos ia-me dando por vencido, lentamente, meus olhos fechavam perante a tua beleza. Ao fecha-los recordo, ainda o teu rosto dessa leitura de Braille feita pelo toque da minha pele na tua, desenhando a mais bonita das imagens na escuridão de um quarto. Amanhã irei acordar cedo, antes mesmo dos teus primeiros movimentos matinais, irei fazer aquilo que já devia ter feito a muito tempo atrás. Decidido adormeço em segundos, abraçado a esse teu corpo pleno de certezas. Adormeço por entre um desejo, ( o teu desejo).

in http://prosa-dor.blogspot.com/

Friday, September 14, 2007

(Oh that feelin's rising...
rising over me)
Oh, that song is singin'
Singin' in to me.
Over everything,
I used to be.

Oh, that song is singin'
Singin' in to me.

Slow and sweet
It caries me
Caries me (x3)
Out to sea

And swallows me
In to the deep
And comforts me (x2)

(Oh, it's all around me, it's all I can see
Even when I close my eyes, It's holdin' me)
Oh, that weight is liftin'
Liftin' on me

(Tenderly)
It caries me
Out to the sea
And swallows me (x3)
Into the deep
And comforts me (x2)
In ... In to the deep
And comforts me (x3)

Oh, that silence signin', singing to me...

Breathe up to me (x2)
Breathe in through me
Breathe out through me
Breathe in through me

ooh Breathe out through... through me
Why don't you breathe in... breathe in through me
and breathe out through me

The cinematic Orchestra - Breathe


Tuesday, September 11, 2007

Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
A palavra no muro
Ficou coberta de tinta
Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
Só ficou no muro tristeza e tinta fresca
Nós que passamos apressados
Pelas ruas da cidade
Merecemos ler as letras
E as palavras de gentileza
Por isso eu pergunto
A você no mundo
Se é mais inteligente
O livro ou a sabedoria
O mundo é uma escola
A vida é o circo
Amor palavra que liberta
Já dizia o profeta

Marisa Monte

Friday, September 7, 2007

São os olhos que aproximam os lugares ao coração.
Agora que regressamos é nisto que penso
enquanto fazemos sinais uns para os outros com as luzes
dos carros, na rápida estrada, ao anoitecer.
Olha-se devagar para a vida e sobretudo assim
damos conta dos silêncios,
dos nomes devolvidos ao tão breve silêncio.
A casa vincada pela névoa, a
aldeia imobilizada ao passearmos em grupos,
o café que me conforta quando o recebo entre as mãos.
Como dizer que são estas as mais secretas regiões da alma
a que voltamos sempre
nos maiores frios de Dezembro?
Se de repente dizem que estamos a uma eternidade
frágil dos dias inquietos,
cruzas uma palma da mão sobre a outra e olhas para as
unhas, rindo de quando em vez para mim, que fico tão feliz.
E no regresso, quando os sobressaltos se repetem
e anoitece nas estradas vazias e o mundo adormece,
há uma solidão que estremece as bermas e nos aflige debaixo da
língua, como uma chuva miudinha.
Como falar depois da tua inclinada cara a meu lado
e do recanto mais longínquo dos pinhais?
Como acreditar que o tempo não trará aos olhos a maior
solidão
em que ficamos ?

Rui Coias

Wednesday, September 5, 2007

Uma parte de mim é todo mundo
Outra parte é ninguém
Fundo sem fundo
Uma parte de mim é multidão
Outra parte estranheza e solidão
Uma parte de mim, pesa, pondera
Outra parte, delira
Uma parte de mim almoça e janta
Outra parte se espanta
Uma parte de mim é permanente
Outra parte se sabe de repente
Uma parte de mim é só vertigem
Outra parte, linguagem
Traduzir uma parte noutra parte
Que é uma questão de vida ou morte
Será arte??

Traduzir-se
Ferreira
Gullar

Sunday, September 2, 2007

Cântico Negro

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

José Régio

Um dia pego na estrela que trago no coração
E atiro-a à cara de alguém...

Um dia agarro todos os meus sonhos
E todos os meus sorrisos
E deito-os num poço,
Já que ninguém os quer...

Um dia junto as pétalas das rosas
E a ternura que trago nas minhas mãos
E ponho-as às costas duma pessoa qualquer...

Um dia apanho o meu olhar mais doce,
O meu búzio mais lindo
E a concha do mar da minha infancia
E deixo-as morrer de fome...

Um dia vou dentro da minha alma
tiro-lhe todos os tesouros
E os mais lindos poemas que trago comigo
E rasgo-os diante duma multidão...

Um dia as asas dos meus pássaros
Baterão com tanta força
Que irei com elas a voar... voar...

Um dia drogo-me por saudade
Da minha ternura perdida,
Violento-me e violento
Uma menina de tranças louras...

Um dia roubo um banco,
Compro uma mota
E fujo para o fim do mundo...

Ai! Dou um beijo a qualquer desconhecido.
Aquele beijo que sempre quis dar...

Júlio Roberto