Monday, January 28, 2008

Não é fácil
Não pensar em você
Não é fácil
É estranho
Não te contar meus planos
Não te encontrar

Todo dia de manhã
Enquanto tomo meu café amargo
É, ainda boto fé
De um dia te ter ao meu lado

Na verdade eu preciso aprender
Não é fácil, não é fácil

Onde você anda
Onde está você
Toda vez que saio
Me preparo pra talvez te ver

Na verdade eu preciso esquecer
Não é fácil, não é fácil

Todo dia de manhã
Enquanto tomo meu café amargo
É, ainda boto fé
De um dia te terá ao meu lado

O que eu faço
O que posso fazer?
Não é fácil
Não é fácil

Se você quisesse ia ser tão legal
Acho que eu seria mais feliz
Do que qualquer mortal

Na verdade não consigo esquecer
Não é fácil
É estranho

Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown
por Marisa Monte

Wednesday, January 23, 2008

"As coisas que existem são o que são, mas as que não existem são o que não são, e isso é muito maior...o que importa não é aquilo que se tem...o que importa é o que ainda aí procuramos... Mas se calhar é só assim que se é homem, o que nos torna a vida um pouco dura... Somos homens em ficção, à custa do que não há? - seremos?"

Vergílio Ferreira - Nítido Nulo

Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca, tardando-lhe o beijo, mordia
Quando à boca da noite surgiste na tarde tal rosa tardia

Quando nós nos olhámos tardámos no beijo que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos ardendo na luz que morria
Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia
Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Foi a noite mais bela de todas as noites que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios que à noite de aromas e beijos se encheram
Foi a noite em que os nossos dois corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram

Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram
Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam
Era a noite mais clara daqueles que à noite amando se deram
E entre os braços da noite de tanto se amarem, vivendo morreram

Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo e acordado recordo no canto
Essa tarde em que tarde surgiste dum triste e profundo recanto
Essa noite em que cedo nasceste despida de mágoa e de espanto

Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto!


José Carlos Ary dos Santos

Monday, January 21, 2008

Palavras que disseste e já não dizes,
palavras como um sol que me queimava,
olhos loucos de um vento que soprava
em olhos que eram meus, e mais felizes.

Palavras que disseste e que diziam
segredos que eram lentas madrugadas,
promessas imperfeitas, murmuradas
enquanto os nossos beijos permitiam.

Palavras que dizias, sem sentido,
sem as quereres, mas só porque eram elas
que traziam a calma das estrelas
à noite que assomava ao meu ouvido...

Palavras que não dizes, nem são tuas,
que morreram, que em ti já não existem
- que são minhas, só minhas, pois persistem
na memória que arrasto pelas ruas.

Palavras minhas
Pedro Tamen por Carlos do Carmo

Sunday, January 20, 2008

1 desejo de amor
2 balas cravadas nas costas
3 mamilos
4 cores garridas
5 gramas de coca
6 corsários imaginados
7 pedras na mão
8 bolsos
9 shots de vodka
10 sentidos alerta
11 ovos no estômago
12 volts como tortura
13 anos de pouca sorte
14 cigarros
15 destinos baralhados
16 balas cravadas noutrem
17 anos de sorte
18 livros ideais
19 78
20 dedos sujos
21 de Fevereiro
22 pestanejar num minuto
23 lambidelas de um cão amiúde
24 horas indesejadas
25 horas indesejadas
26 horas indesejadas
27 voltas à minha volta
28
29
30
31
32 dentes cerrados
33 r.p.m.
34 ajuda-me
35
36
37
38
39
40 graus centigrados
41 graus centigrados
42 graus de febre
43 graus centigrados
44
45graus centigrados
46
47
48
49
50 não me estão a olhar
51
52 cartas por distribuir
53
54
55
56
57
58 presente
59
60
61
62 graus centigrados
63 graus centigrados
64 graus centigrados
65 graus centigrados
66 nervos em franja
67
68
69
70 ajudem-me
71
72
73
74 ajudem-me
75
76
77
78 ajudem-me
79
80
81
82 desculpem-me
83
84
85 refrões iguais
86 duma mesma música
87
88 ninguém me liga
89
90
91
92
93
94 Ai
95
96
97
98 Por favor
99
100 Será que
101 ninguém me
102 solta
103
104 Sofro
105
106 Isto é a sério
107
108 fósforos aqui
109 elementos
110 volts de tortura
111 séculos herdados
112 Telefona
113 pêlos eriçados
114 mirtilhos
115 é 112
116 Ajudem-me
117 Ai
118 Ninguém me liga
119 Isto é a sério
120 Por favor
121
122 Desculpem-me
123 venham comigo
124
125 km/h em contramão
126 km/h em contramão
127 Fiat em contramão
128 fugimos em contramão
129 ficam onde estão
130
131
132
133 E se dessem
134 ao criminoso
135 a visão da morte,
136 sem a morte?
137
138
139 Sublime e odiosa
140 morte.
141 Sublime
142 porque desperta a consciência
143
144 Odiosa
145 porque a mata
146 nesse preciso instante.
147 Ajuda-me
148
149
150 pessoas a olhar-me todas incapazes de me soltar

in Agatha Christie by Teatro Praga

Friday, January 18, 2008

O poder do encontro
desencaixa o corpo de um eixo
porque tem música a escorrer das bocas
e línguas de fogo a incendiar as mãos.

é uma orquestra de pulso
em que o sangue cresce em contralto
e dá laçadas ao sopro do pescoço.

e dá uma vontade de envolver a pele num lume acima das cabeças
e sentirmo-nos dentro e fora do olhar
como se a fusão fosse o núcleo químico da força dos homens.

Tomamos Café? de José Miguel Vitorino

Sunday, January 6, 2008

I'm not following you.
My car's parked over there.


- In Smart Park?
- No, on Front Street.


Oh, I parked in Smart Park.


So, at the end of the next block
we'll separate. At Tyrone Street.


Yeah, the "Ice Land" sign is halfway.


It's the halfway... point.


Ice Land is—


It's kind of like that point
in a relationship, you know...


where you suddenly realize
it's not gonna last forever.


You know, you can
see the end in sight.


Tyrone Street.


Yeah, but we're not even there yet.


We're still at the good part.
We're not even sick of each other yet.


I'm not sick of you at all.


And wow! It's been a good
like six months, right?


What? Six months?


Then the Ice Land sign
is like eight months?


You think we'd only last
a year and a half?


I don't know. I don't
want to be presumptuous.


- I don't know if you're married or what.
- I'm not.


Well, I'm separated.
We separated last month.


I was thinking...


that Tyrone...


was like years away at least.


- Yeah?
- Yeah.


Okay. Well, actually
I was thinking...


Tyrone is, like,
when we die of old age.


And this is, like, our whole life
together, this block.


See, that's perfect.


- Let's do it that way.
- Okay.


Well, guess it can't be avoided.
Everyone dies.


I could walk you to your car.


Maybe we should just be glad...


that we lived this long,
good life together.


You know, it's so much more
than most people ever get to have.

Me and You And Everyone We Know
by Miranda July

Tuesday, January 1, 2008

"It's like you come onto this planet with a crayon box.
Now, you may get the 8-pack, you may get the 16-pack.
But it's all in what you do with the crayons,
the colors that you're given.
Don't worry about drawing within the lines or coloring outside the lines.
I say color outside the lines. Color right off he page.
Don't box me in. We're in motion to the ocean.
We are not landlocked, I'll tell ya that.
So where do you want out?
Uh, who, me? Am I first?
Um, I don't know. Really, anywhere is fine.
Well, just--just give me an address or something, okay?
take a right, go two more blocks,
drop this guy off on the next corner.
- Where's that? - I don't know either, but it's somewhere,
and it's gonna determine the course of the rest of your
life."


Waking Life by Richard Linklater